Contribuição ao estudo da ação in vitro do veneno da aranha marrom, Loxosceles gaucho, sobre plaquetas humanas e de coelho. Participação das plaquetas na dermonecrose induzida experimentalmente pelo veneno loxoscélico em coelhos
Resumen
Os venenos de aranhas do gênero Loxosceles possuem uma ampla gama de atividades em
diferentes células, tecidos e sistemas, e é notória a sua capacidade de causar a formação da lesão
dermonecrótica. Em um trabalho prévio, relatamos uma intensa trombocitopenia induzida pelo
veneno loxoscélico em coelhos. Objetivou-se no presente estudo avaliar primeiramente a
interação in vitro entre as plaquetas, humanas e de coelhos, com o veneno de Loxosceles gaucho
e seu principal componente, a fração esfingomielinásica. Posteriormente, investigou-se o papel da
plaqueta no desenvolvimento da lesão dermonecrótica através de um modelo de trombocitopenia
em coelhos. Nos estudos in vitro, os resultados de agregação em plasma rico em plaquetas
evidenciou que tanto o veneno total quanto a fração esfingomielinásica induziram um aumento
desta resposta nas plaquetas das duas espécies, que foi mais intensa nas plaquetas humanas. Uma
vez que em plaquetas lavadas a agregação não foi constatada, confirmou-se a necessidade de
componente(s) plasmático(s) para a indução desta resposta. Ainda, os dados de LDH indicaram
que o veneno total, nas concentrações aqui utilizadas, não foi capaz de causar à lise plaquetária.
Com relação à ativação, o veneno total, foi capaz de aumentar a expressão da LIBS1 nas
plaquetas de ambas as espécies e de P-selectina na plaqueta de coelho. Sob as nossas condições
experimentais, a fração não promoveu o aumento dos marcadores de ativação. Finalizando os
estudos in vitro, o veneno total e a fração provocaram um aumento da adesão nas plaquetas das
duas espécies, sendo que a resposta à fração esfingomielinásica mostrou-se dose-dependente. O
estudo experimental, por vez, necessitou de uma etapa preliminar para a obtenção de um
anticorpo anti-plaqueta, produzido em cabras, que mostrou-se eficaz em induzir um intenso
quadro trombocitopênico em coelhos. Análises histopatológicas indicam que a ausência das
plaquetas não diminuiu a formação de trombos intravasculares na área da derme sob a ação do
veneno. O desenvolvimento da lesão dermonecrótica em coelhos injetados com o veneno loxoscélico mostrou-se mais intenso naqueles depletados de plaquetas do que nos animais com
número normal de plaquetas, constatável pelo desenvolvimento de maiores áreas de equimose e
das escaras necróticas. Os resultados semelhantes dos níveis plasmáticos do fator de von
Willembrand, dos tempos de protrombina e de tromboplastina parcial ativada, assim como dos
testes de fagocitose por polimorfonucleares isolados do sangue periférico, entre os coelhos
trombocitopênicos e aqueles com contagem normal de plaquetas, evidenciam que não houve
alterações expressivas nas células endoteliais, no sistema da coagulação e na capacidade
fagocítica via C3b dos polimorfonucleares do sangue periférico. Os presentes resultados mostram
que o veneno loxoscélico in vitro é capaz de elicitar em plaquetas humanas e de coelhos as
respostas de agregação, de adesão e de ativação. Por fim, as diferenças no desenvolvimento da
lesão, constatadas entre o animal trombocitopênico e o animal normal, evidenciam que a plaqueta
é um fator importante para controlar a expansão e a gravidade da lesão dermonecrótica induzida
em coelhos pelo veneno loxoscélico. Venoms from Loxosceles spiders exhibit a wide range of activities on different cells, tissues and
systems, being specially evident their ability to cause a dermonecrotic lesion. In a previous paper,
we showed that Loxosceles gaucho spider venom induces intense thrombocytopenia in rabbits.
Thus, in the present study, we firstly aimed to evaluate the in vitro interaction between human
and rabbits platelets and L. gaucho venom and its major component, the sphingomyelinase
fraction. Secondly, we investigated the platelet role in the dermonecrotic lesion formation using
an experimental model of thrombocytopenia in rabbits. Both total venom and its
sphingomyelinase fraction stimulated in vitro aggregation per se in platelet-rich plasma from
both species, but a more intense response was obtained with human platelets. Taking into
consideration that neither total venom nor its sphingomyelinase fraction induced aggregation of
washed platelets, it can be deduced that one or more plasma components are necessary to induce
this response. Moreover, LDH data indicated that total venom, at least at the concentration levels
used in this study, cannot induce platelet lysis. Regarding platelet activation, total venom was
able to increase the expression of LIBS1 on both human and rabbit platelet surface and P-selectin
on only rabbit platelet surface. However, the sphingomyelinase fraction did not increase the
expression of any marker of platelet activation, at least in the experimental conditions used in this
study. Another in vitro study showed that both total venom and its sphingomyelinase fraction
induce an increase in human and rabbit platelet adhesion, with the sphingomyelinase fraction
exhibiting a dose-dependent response. For the study using an animal model of thrombocytopenia,
it was necessary to previously produce goat antibodies against rabbit platelets, which showed to
be effective to induce an intense thrombocytopenia in rabbits. Histopathological analysis of
venom-induced dermic tissue lesion indicated that platelet absence does not decrease the formation of intravascular thrombi in the injured area. Nonetheless, bigger areas of equimosis and
necrotic scabs could be observed in the dermonecrotic lesion of rabbits injected with loxoscelic
venom and depleted of platelets. In the different groups, plasma levels of von Willembrand
factor, prothrombin and activated partial thromboplastin times, and data from phagocytosis tests
using polymorphonuclear cells isolated from rabbit periferical blood were similar comparing
thrombocitopenic rabbits with those exhibiting normal platelet count; therefore, we can deduce
that there is not any expressive alteration in endotelial cells, coagulation system and phagocytic
ability of polymorphonuclear leukocytes via their complement receptor C3b. In conclusion, the
loxoscelic venom is able to unchain in vitro different mechanisms leading to adhesion, activation
and aggregation of both human and rabbit platelets. Furthermore, due to differences in the dermic
lesion patterns between thrombocitopenic and normal animals, we can conclude that platelets
must play a key role in controlling the expansion and severity of the dermonecrotic lesion
induced in rabbits by L. gaucho venom.